Liturgia Diária
2 – QUARTA-FEIRA
4ª SEMANA DA QUARESMA
(roxo – ofício do dia)
Para vós elevo minha oração, neste tempo favorável, Senhor Deus! Respondei-me pelo vosso imenso amor, pela vossa salvação que nunca falha! (Sl 68,14)
O Princípio Supremo jamais abandona aqueles que caminham na luz da consciência e da verdade. Em sua manifestação no Verbo, revela a obra incessante que conduz cada ser à plenitude da existência. Que todos os que acolheram a sabedoria eterna sejam testemunhas vivas da liberdade interior, refletindo, em seus atos, a ordem harmoniosa que sustenta a dignidade e a autodeterminação do espírito. Que suas vidas sejam faróis de esperança, irradiando a luz que dissipa as sombras da ignorância e conduz a humanidade ao reconhecimento de sua essência transcendente e inalienável.
Lectio sancti Evangelii secundum Ioannem (5,17-30)
17 Iesus autem respondit eis: «Pater meus usque modo operatur, et ego operor».
Jesus, porém, respondeu-lhes: «Meu Pai continua trabalhando até agora, e eu também trabalho».
18 Propterea ergo magis quaerebant eum Iudaei interficere, quia non solum solvebat sabbatum, sed et Patrem suum dicebat Deum, aequalem se faciens Deo.
Por isso, ainda mais os judeus procuravam matá-lo, porque não só violava o sábado, mas também dizia que Deus era seu Pai, fazendo-se igual a Deus.
19 Respondit itaque Iesus et dixit eis: «Amen, amen dico vobis: non potest Filius a se facere quidquam, nisi quod viderit Patrem facientem; quaecumque enim ille facit, haec et Filius similiter facit.
Então Jesus respondeu-lhes e disse: «Em verdade, em verdade vos digo: o Filho nada pode fazer por si mesmo, a não ser o que vê o Pai fazer; pois tudo o que este faz, o Filho também o faz igualmente.
20 Pater enim diligit Filium et omnia demonstrat ei, quae ipse facit, et maiora his demonstrabit ei opera, ut vos miremini.
Pois o Pai ama o Filho e lhe mostra tudo o que ele faz, e lhe mostrará obras maiores do que estas, para que vos maravilheis.
21 Sicut enim Pater suscitat mortuos et vivificat, sic et Filius, quos vult, vivificat.
Pois assim como o Pai ressuscita os mortos e lhes dá vida, assim também o Filho dá vida a quem quer.
22 Neque enim Pater iudicat quemquam, sed iudicium omne dedit Filio,
Porque o Pai a ninguém julga, mas entregou todo julgamento ao Filho,
23 ut omnes honorificent Filium, sicut honorificant Patrem. Qui non honorificat Filium, non honorificat Patrem, qui misit illum.
para que todos honrem o Filho como honram o Pai. Quem não honra o Filho, não honra o Pai que o enviou.
24 Amen, amen dico vobis: qui verbum meum audit et credit ei, qui misit me, habet vitam aeternam et in iudicium non venit, sed transiit a morte in vitam.
Em verdade, em verdade vos digo: quem ouve a minha palavra e crê naquele que me enviou tem a vida eterna e não será condenado, mas passou da morte para a vida.
25 Amen, amen dico vobis: venit hora, et nunc est, quando mortui audient vocem Filii Dei, et, qui audierint, vivent.
Em verdade, em verdade vos digo: vem a hora, e agora é, em que os mortos ouvirão a voz do Filho de Deus, e os que a ouvirem viverão.
26 Sicut enim Pater habet vitam in semetipso, sic dedit et Filio vitam habere in semetipso;
Pois assim como o Pai tem a vida em si mesmo, assim também concedeu ao Filho ter a vida em si mesmo.
27 et potestatem dedit ei iudicium facere, quia Filius hominis est.
E deu-lhe autoridade para exercer o julgamento, porque é o Filho do Homem.
28 Nolite mirari hoc, quia venit hora, in qua omnes, qui in monumentis sunt, audient vocem eius
Não vos admireis disso, pois vem a hora em que todos os que estão nos túmulos ouvirão a sua voz
29 et procedent, qui bona fecerunt, in resurrectionem vitae, qui vero mala egerunt, in resurrectionem iudicii.
e sairão: os que fizeram o bem, para a ressurreição da vida; e os que praticaram o mal, para a ressurreição do julgamento.
30 Non possum ego a meipso facere quidquam; sicut audio, iudico, et iudicium meum iustum est, quia non quaero voluntatem meam, sed voluntatem eius, qui misit me.
Eu nada posso fazer por mim mesmo; julgo conforme o que ouço, e meu julgamento é justo, porque não busco a minha vontade, mas a vontade daquele que me enviou.
Reflexão:
"Amen, amen dico vobis: qui verbum meum audit et credit ei, qui misit me, habet vitam aeternam et in iudicium non venit, sed transiit a morte in vitam."
"Em verdade, em verdade vos digo: quem ouve a minha palavra e crê naquele que me enviou tem a vida eterna e não será condenado, mas passou da morte para a vida." (Jo 5:24)
Esta passagem resume a essência da mensagem de Cristo: a fé e a adesão à verdade conduzem à plenitude da vida, superando a morte e o julgamento.
A verdade não se impõe pela força, mas se manifesta na liberdade daquele que a reconhece. O Cristo, imagem da plenitude do ser, revela que o destino humano é participação ativa na ordem do eterno. O que o Pai realiza, o Filho também realiza, pois o chamado à vida transcende toda forma de servidão. O homem desperta para a luz quando assume sua vocação de ser criador consigo mesmo, respondendo à voz que o convoca para além das limitações impostas. A existência se eleva quando se alinha ao princípio que sustenta a vida em sua integralidade.
HOMILIA
O Chamado à Plenitude da Vida
Amados, diante das palavras do Senhor, somos convidados a contemplar a obra contínua do Pai, que nunca cessa de agir, e do Filho, que reflete essa ação em sua própria missão: «Pater meus usque modo operatur, et ego operor» (Jo 5,17). Eis o grande mistério que nos envolve: a criação não é um ato fixo no tempo, mas um movimento incessante, um fluxo de realização que exige a participação ativa de cada um de nós.
Cristo nos revela que a vida não se define por meros instantes passageiros, mas por um contínuo transpor de fronteiras. O Filho vê o que o Pai faz e, ao reconhecer essa obra, torna-se seu agente no mundo. Da mesma forma, quem escuta sua palavra e crê naquele que o enviou, passa da morte para a vida (Jo 5,24). Não se trata apenas de uma promessa futura, mas de uma realidade que se impõe no presente: viver plenamente significa aderir à verdade que nos torna livres, reconhecer no fluxo da existência o chamado à transcendência.
Muitos veem no juízo de Deus uma ameaça, um limite imposto à liberdade humana. No entanto, Cristo nos ensina que o verdadeiro julgamento não é uma imposição externa, mas o reflexo daquilo que escolhemos ser. «Non possum ego a meipso facere quidquam» (Jo 5,30) — o Filho age em consonância com a Vontade do Pai, não por submissão cega, mas porque a verdade se manifesta na unidade do querer. Da mesma forma, somos chamados a ordenar nossa existência não pelo peso de mandamentos impostos, mas pelo desejo profundo de nos alinharmos ao que é bom, justo e verdadeiro.
O destino do homem é a ressurreição, mas não como um evento distante, e sim como uma transformação que já começa agora. Os que praticam o bem emergem para a vida; os que se afastam da verdade encontram o juízo (Jo 5,29). Não há condenação arbitrária, mas a colheita das próprias escolhas. A vida é um chamado à expansão, ao reconhecimento de que nossa essência é moldada pelo que cultivamos no tempo.
Que nossas ações sejam como as do Filho, que não buscou sua própria vontade, mas a vontade daquele que o enviou. Que nossas escolhas sejam movidas pela luz da verdade e pelo desejo de uma existência plena. Pois a vida não é um peso a carregar, mas um horizonte a desbravar.
EXPLICAÇÃO TEOLÓGICA
A Transição da Morte para a Vida: O Mistério da Existência em Cristo
A afirmação de Cristo em João 5,24 — «Em verdade, em verdade vos digo: quem ouve a minha palavra e crê naquele que me enviou tem a vida eterna e não será condenado, mas passou da morte para a vida» — revela a estrutura mais profunda da realidade espiritual do ser humano. Esta passagem não apenas proclama a promessa da vida eterna, mas revela que essa transição já ocorre no presente para aqueles que aderem à verdade do Verbo.
1. O Ato de Ouvir e Crer: Uma Abertura para o Absoluto
A primeira condição estabelecida por Cristo é ouvir sua palavra. Esse ouvir não se restringe à percepção sensível, mas implica uma escuta interior, uma adesão existencial àquilo que Ele revela. O verbo grego utilizado para "ouvir" (ἀκούειν, akouein) denota uma escuta que exige compreensão e resposta. Assim, quem verdadeiramente ouve não apenas recebe uma informação, mas se dispõe à transformação.
O segundo elemento essencial é crer naquele que enviou Cristo. O Pai e o Filho não são agentes independentes, mas a fé no Pai se realiza na aceitação do Filho. Jesus, como Logos divino, é a revelação do Pai no tempo, e crer Nele é inserir-se na dinâmica do amor divino que sustenta todas as coisas. Esse crer não se reduz a um assentimento intelectual, mas é um ato profundo de confiança que configura a existência daquele que crê.
2. Vida Eterna: Uma Realidade Presente
Cristo não diz que quem ouve e crê terá a vida eterna no futuro, mas já a possui: «habet vitam aeternam». Isso significa que a vida eterna não é apenas um destino escatológico, mas uma realidade que se inicia no presente. Participar da vida divina não depende de um evento futuro, mas de uma transformação interior que ocorre no tempo.
A eternidade, nesse sentido, não é uma mera continuidade indefinida do tempo, mas a inserção do homem em uma plenitude que transcende a caducidade das coisas passageiras. O que Cristo propõe não é apenas um consolo para depois da morte, mas um novo modo de existir que já se manifesta em quem acolhe sua palavra.
3. O Julgamento e a Superação da Condenação
A consequência direta desse novo modo de existir é que aquele que crê não será condenado («in iudicium non venit»). O juízo de Deus não é um processo externo e arbitrário, mas a manifestação da verdade sobre cada ser. Quem está unido ao Verbo já está inserido na realidade da luz, e a condenação não pode alcançá-lo, pois ele já vive segundo a ordem divina.
A ideia de condenação está associada à alienação do verdadeiro sentido da vida. O pecado, enquanto recusa da verdade, não é um simples erro moral, mas um fechamento ao princípio vital que sustenta o ser. Assim, quem se une a Cristo já está em comunhão com a fonte da existência e, por isso, ultrapassa o juízo, pois já participa da luz que julga todas as coisas.
4. A Passagem da Morte para a Vida
A frase culmina com uma afirmação decisiva: «sed transiit a morte in vitam» — passou da morte para a vida. O verbo transire indica um movimento real e definitivo. A morte, aqui, não se refere apenas à cessação biológica, mas ao estado de separação da fonte divina. Aquele que não está em comunhão com Deus já experimenta uma forma de morte, pois está desconectado da plenitude do ser.
Ao crer no Filho e no Pai, o homem não apenas aguarda a vida, mas já entra nela. A transição da morte para a vida ocorre como um processo espiritual real, onde a existência, antes limitada e fragmentada, se abre para uma totalidade que a redime e a plenifica.
Conclusão: A Verdade que Liberta o Homem
João 5,24 não é apenas uma promessa futura, mas uma revelação sobre a estrutura mesma da realidade espiritual do homem. Aquele que ouve e crê entra no dinamismo da eternidade já no presente. Ele já participa da vida que não conhece corrupção, pois se une Àquele que é a própria Vida.
Assim, essa passagem nos convida a um compromisso radical com a verdade do Verbo. Não basta esperar pela vida futura, mas é necessário viver agora segundo a luz. A eternidade não está separada do tempo, mas se insere nele, para que cada escolha e cada ato humano se tornem expressão do infinito.
Leia também: LITURGIA DA PALAVRA
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