Liturgia Diária
3 – SEGUNDA-FEIRA
8ª SEMANA COMUM
(verde – ofício do dia)
O Senhor tornou-se meu protetor e me conduziu para um lugar espaçoso; ele me salvou, porque me ama (Sl 17,19s).
A liturgia nos orienta a transcender a prisão do erro, elevando-nos para a essência pura da verdade. Ao nos voltarmos para o Altíssimo, despojamo-nos das sombras da injustiça, buscando a liberdade interior. Nesse caminho, celebramos a revelação divina que nos conduz à autêntica compreensão. A disposição para seguir seus preceitos não é imposta, mas surge do nosso próprio desejo de alinhamento com o Bem supremo. A verdadeira liberdade reside em reconhecer a verdade, e na liberdade de escolha, encontramos o poder de restaurar a harmonia cósmica, refletindo a perfeição da ordem divina em nossa essência.
Evangelium secundum Marcum 10,17-27
17 Et cum egressus esset in viam, procurrens quidam genu flexo ante eum, rogabat eum: Magister bone, quid faciam ut vitam æternam percipiam?
E quando saía pelo caminho, correu para ele um certo homem, e, ajoelhando-se, perguntou-lhe: Bom Mestre, que devo fazer para herdar a vida eterna?
18 Jesus autem dixit ei: Quid me dicis bonum? Nemo bonus, nisi unus Deus.
Jesus, porém, lhe disse: Por que me chamas bom? Ninguém é bom, senão um, que é Deus.
19 Præcepta nosti: ne adulteres, ne occidas, ne fureris, ne falsum testimonium dixeris, ne fraudem feceris, honora patrem tuum et matrem.
Conheces os mandamentos: não cometerás adultério, não matarás, não furtarás, não dirás falso testemunho, não cometerás fraude, honra teu pai e tua mãe.
20 At ille respondens, ait illi: Magister, hæc omnia observavi a juventute mea.
Mas ele, respondendo, disse-lhe: Mestre, tudo isso guardei desde a minha juventude.
21 Jesus autem intuitus eum, dilexit eum, et dixit ei: Unum tibi deest: vade, quæcumque habes vende, et da pauperibus, et habebis thesaurum in cælo: et veni, sequere me.
E Jesus, olhando para ele, amou-o e disse-lhe: Uma coisa te falta: vai, vende tudo o que tens, e dá-o aos pobres, e terás um tesouro no céu; e vem, segue-me.
22 Qui contristatus in verbo, abiit mærens: erat enim habens multas possessiones.
Mas ele, entristecido com essas palavras, retirou-se pesaroso, pois possuía muitos bens.
23 Et circumspiciens Jesus, ait discipulis suis: Quam difficile qui pecunias habent, in regnum Dei introibunt!
E, olhando ao redor, Jesus disse a seus discípulos: Quão dificilmente entrarão no Reino de Deus os que possuem riquezas!
24 Discipuli autem obstupescebant in verbis ejus. At Jesus rursus respondens ait illis: Filioli, quam difficile est, qui confidunt in pecuniis, in regnum Dei introire!
E os discípulos ficaram espantados com suas palavras. Mas Jesus, tornando a falar, disse-lhes: Filhinhos, quão difícil é para os que confiam nas riquezas entrar no Reino de Deus!
25 Facilius est camelum per foramen acus transire, quam divitem intrare in regnum Dei.
É mais fácil um camelo passar pelo buraco de uma agulha do que um rico entrar no Reino de Deus.
26 Qui magis admirabantur, dicentes ad semetipsos: Et quis potest salvus fieri?
E eles, ainda mais admirados, diziam entre si: Então, quem poderá salvar-se?
27 Et intuens illos Jesus, ait: Apud homines impossibile est, sed non apud Deum: omnia enim possibilia sunt apud Deum.
E Jesus, olhando para eles, disse: Aos homens é impossível, mas não a Deus; porque para Deus todas as coisas são possíveis.
Reflexão:
Et intuens illos Jesus, ait: Apud homines impossibile est, sed non apud Deum: omnia enim possibilia sunt apud Deum.
E Jesus, olhando para eles, disse: Aos homens é impossível, mas não a Deus; porque para Deus todas as coisas são possíveis. (Mc 10:27)
Quem busca a plenitude do ser não pode estar atado ao transitório, pois a liberdade verdadeira nasce da autonomia do espírito. Aquele que confia apenas no tangível perde a oportunidade de se elevar à verdade essencial. O convite do Mestre não é renúncia, mas abertura ao infinito, à posse daquilo que não se perde. O caminho não impõe servidão, mas revela a grandeza de um destino que só se alcança pelo desapego ao efêmero. Aquele que vê além das aparências compreende que a grandeza está em expandir a própria existência para além dos limites impostos pela matéria.
HOMILIA
A Jornada da Transcendência e a Liberdade do Espírito
Caros irmãos e irmãs,
No Evangelho de Marcos 10,17-27, encontramos o relato de um homem rico que se aproxima de Jesus com a busca de uma resposta vital: "O que devo fazer para herdar a vida eterna?" Jesus o chama a um desafio radical: desapegar-se das riquezas e seguir o caminho da simplicidade e do amor. Mas, ao enfrentar esse chamado, o homem se entristece, pois suas posses são muitas. Esse episódio não é apenas um convite ao desprendimento material, mas um convite à transcendência da alma.
Em nosso tempo, como na época desse homem, vivemos imersos em um mundo que valoriza a aquisição material, a busca por status e a segurança nas posses. Somos frequentemente condicionados a acreditar que a felicidade e a realização dependem de nossos bens, da nossa posição social, da nossa capacidade de acumular e manter. No entanto, o Evangelho nos chama a refletir sobre o verdadeiro sentido da vida e o que realmente nos liberta.
Jesus nos aponta para um caminho que não se limita ao terreno visível. Ele nos desafia a ir além da lógica da matéria, a desapegar-nos daquilo que é efêmero para abrir espaço àquilo que é eterno. A verdadeira liberdade não está na posse de coisas, mas na capacidade de se desapegar delas e seguir um caminho de amor, de justiça e de busca por uma compreensão mais profunda da nossa própria existência.
Na filosofia que considera a evolução do espírito humano, compreendemos que o ser não é um ente isolado, mas parte de um movimento contínuo de expansão e transformação. Cada ato de renúncia àquilo que é passageiro permite à alma se expandir para novas dimensões de entendimento e virtude. O verdadeiro ser humano é aquele que, com plena liberdade, se abre para a grandeza de seu destino cósmico, não atado às amarras do imediato.
O desafio que Jesus propõe é o de um constante processo de auto-superação. Ao nos desapegarmos das distrações que nos prendem, como o homem rico que se entristece, começamos a experimentar o crescimento interior que nos aproxima da essência divina que habita em cada um de nós. A vida eterna, portanto, não é um conceito distante, mas uma realidade que pode ser vivida aqui e agora, através da liberdade de escolhas alinhadas com a verdade universal.
Jesus também nos lembra da possibilidade de transcendência diante do que parece impossível aos olhos humanos. Para os homens, a verdadeira liberdade pode parecer inalcançável, mas, como Ele afirma, "todas as coisas são possíveis a Deus". Quando nos entregamos àquilo que nos é superior, ao propósito maior, transcendemos os limites impostos pela nossa própria natureza limitada e nos unimos à ordem cósmica, participando de um movimento que é ao mesmo tempo individual e universal.
Portanto, irmãos e irmãs, o convite de hoje é o mesmo: despojemo-nos do que nos prende à superfície da existência e busquemos aquilo que realmente nos eleva. A vida eterna não está apenas na promessa de um futuro distante, mas na transformação do nosso ser, na capacidade de amar e de nos liberar das amarras da materialidade. A verdadeira liberdade é a liberdade de nos tornarmos plenamente humanos, à medida que nos aproximamos da nossa natureza mais profunda, aquela que está em harmonia com o divino e com o cosmos.
Que possamos, assim, seguir o exemplo de Jesus, confiando que ao escolher o caminho da verdade, do amor e da simplicidade, estamos trilhando o caminho da verdadeira liberdade e da verdadeira vida. Que nos desapeguemos das riquezas que nos prendem e sigamos o Senhor, rumo à plenitude que nos aguarda.
Amém.
EXPLICAÇÃO TEOLÓGICA
A Possibilidade Divina e a Limitação Humana – Uma Reflexão Teológica sobre Marcos 10,27
A afirmação de Jesus em Marcos 10,27 — “Aos homens é impossível, mas não a Deus; porque para Deus todas as coisas são possíveis” — sintetiza uma das mais profundas realidades da teologia cristã: a distinção entre a limitação da criatura e a plenitude do Criador. Essa frase se insere no contexto da dificuldade do homem rico em abandonar suas posses para seguir Cristo, demonstrando como as amarras da materialidade podem dificultar a abertura à verdade divina. No entanto, Jesus não encerra sua mensagem no impossível humano, mas revela que, em Deus, toda limitação pode ser superada.
1. A Dualidade Entre a Possibilidade Humana e a Possibilidade Divina
O homem, enquanto ser contingente, está submetido às leis do tempo, da matéria e da finitude. Seu entendimento e sua vontade são condicionados pelas circunstâncias e pelas próprias fraquezas. Dessa forma, há realidades que transcendem sua capacidade, pois sua natureza está marcada pela limitação.
Deus, por outro lado, é o Ser necessário, absoluto e infinito. Nele não há restrições impostas pelo tempo ou pela matéria. Sua vontade é perfeita, sua inteligência abarca todas as realidades, e seu poder se estende sobre tudo. Aquilo que, aos olhos humanos, parece intransponível, para Deus não representa obstáculo, pois Ele age além da ordem natural.
Quando Jesus afirma que "para Deus todas as coisas são possíveis", Ele reafirma o princípio da onipotência divina, segundo o qual nada está fora do alcance do Criador. Isso não significa que Deus aja arbitrariamente ou contraditoriamente, mas que seu poder é absoluto dentro da coerência de sua própria natureza, sempre em harmonia com sua justiça e sabedoria.
2. O Impossível da Salvação Humana Sem a Graça
No contexto imediato do versículo, Jesus responde ao espanto dos discípulos diante da dificuldade que um homem rico tem de entrar no Reino de Deus. O problema, contudo, não é apenas a riqueza material, mas a confiança excessiva no próprio esforço e a ilusão de autossuficiência. O ser humano, por si só, não pode salvar-se. Nenhum mérito, esforço ou acúmulo de boas obras bastaria para alcançar a vida eterna sem a intervenção da graça divina.
O impossível, então, reside na tentativa do homem de alcançar a plenitude espiritual confiando apenas em suas forças. Mas Deus, na sua infinita misericórdia, possibilita a redenção, pois é Ele quem age no coração humano, libertando-o das amarras que o impedem de alcançar a verdadeira vida. A salvação não é obra exclusiva da vontade humana, mas fruto da cooperação entre a liberdade do homem e a graça divina.
3. A Relação Entre o Finito e o Infinito
A frase de Jesus nos leva a uma consideração metafísica fundamental: a relação entre o finito e o infinito. O ser humano, como criatura finita, não pode, por si mesmo, ultrapassar seus próprios limites; mas quando se abre à ação de Deus, ele se torna participante de uma realidade superior.
Essa participação é o que permite ao homem superar a si mesmo. Sua inteligência limitada pode ser iluminada pela sabedoria divina; sua vontade vacilante pode ser fortalecida pela graça; sua fraqueza pode ser sustentada pelo poder de Deus. Assim, o impossível se torna possível não porque o homem se torna divino por si mesmo, mas porque é elevado por Aquele que transcende todas as limitações.
4. A Aplicação na Vida Espiritual
A grande lição de Marcos 10,27 é que não devemos confiar apenas em nossas próprias forças, mas devemos nos abrir à ação divina. Todos enfrentamos desafios que, aos olhos humanos, parecem impossíveis: superar vícios, perdoar o inimigo, vencer as angústias, suportar tribulações. Mas, ao nos rendermos à verdade de que Deus age em nós, encontramos forças que não sabíamos possuir.
A história da fé é repleta de testemunhos daqueles que, confiando em Deus, realizaram o que parecia inalcançável. Santos, místicos e homens e mulheres de fé experimentaram a ação divina tornando possível aquilo que a lógica humana negava.
Jesus nos convida, portanto, a confiar na possibilidade divina. O impossível humano não é o fim da jornada, mas o início de uma nova realidade, na qual Deus manifesta seu poder e nos conduz para além do que podemos imaginar.
Conclusão
Marcos 10,27 é um chamado à humildade e à confiança. Humildade para reconhecer nossas limitações, e confiança para entregar nossa existência Àquele para quem nada é impossível. Quando abandonamos a ilusão de que podemos nos salvar por nossos próprios méritos e aceitamos a ação de Deus em nossa vida, tornamo-nos verdadeiramente livres. A partir desse momento, o impossível se dissolve diante da força transformadora do Criador.
Leia também: LITURGIA DA PALAVRA
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