Liturgia Diária
4 – TERÇA-FEIRA
8ª SEMANA COMUM
(verde – ofício do dia)
O Senhor tornou-se meu protetor e me conduziu para um lugar espaçoso; ele me salvou, porque me ama (Sl 17,19s).
A verdadeira elevação do ser manifesta-se na escolha consciente de afastar-se da corrupção e da desordem moral, orientando-se para a justiça essencial. Aquele que busca a plenitude da existência deve libertar-se das amarras do apego material, pois a autêntica dignidade repousa na soberania do espírito sobre as posses efêmeras. No sacrifício livremente assumido, encontra-se a mais alta expressão da vontade ordenada à verdade. Assim, na comunhão do sagrado, celebra-se não apenas um rito, mas a afirmação da consciência que, em sua liberdade, reconhece o chamado à transcendência e ao equilíbrio que fundamenta a harmonia do cosmos.
Evangelium: Marcus 10,28-31
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Respondens Petrus, coepit dicere ei: Ecce nos dimisimus omnia et secuti sumus te.
Respondendo, Pedro começou a dizer-lhe: Eis que nós deixamos tudo e te seguimos. -
Iesus dixit: Amen dico vobis, non est qui reliquerit domum aut fratres aut sorores aut matrem aut patrem aut filios aut agros propter me et propter Evangelium,
Jesus disse: Em verdade vos digo: Não há quem tenha deixado casa, ou irmãos, ou irmãs, ou mãe, ou pai, ou filhos, ou terras, por causa de mim e do Evangelho, -
qui non accipiat centuplum nunc in tempore isto domos et fratres et sorores et matres et filios et agros cum persecutionibus, et in futuro saeculo vitam aeternam.
que não receba cem vezes tanto, agora, neste tempo, casas, irmãos, irmãs, mães, filhos e terras, com perseguições, e no século futuro, a vida eterna. -
Multi autem erunt primi novissimi, et novissimi primi.
Porém, muitos que são os primeiros serão últimos, e os últimos serão primeiros.
Reflexão:
Multi autem erunt primi novissimi, et novissimi primi.
Porém, muitos que são os primeiros serão últimos, e os últimos serão primeiros. (Mc 10:31)
A busca pela verdade e pela plenitude do ser exige uma entrega consciente, que transcende as limitações do mundo material. A renúncia aos bens terrenos não é uma perda, mas um caminho para um alcance maior, onde o ser se reconcilia com sua essência espiritual. Ao seguir esse chamado, a verdadeira liberdade surge, pois a pessoa é capaz de se libertar das amarras que a prendem ao efêmero. Nesse movimento, a multiplicação de valores espirituais supera as limitações do tempo e do espaço, revelando um horizonte infinito, onde cada ato de fé e verdade ressoa na eternidade.
HOMILIA
O Caminho da Verdade e da Transcendência
Hoje, as palavras de Jesus no Evangelho de Marcos 10,28-31 nos convidam a refletir sobre o verdadeiro sentido da vida, especialmente em tempos de desilusão e incerteza. "Eis que nós deixamos tudo e te seguimos", diz Pedro a Jesus, e essa declaração não é apenas um gesto de fé, mas um chamado à coragem de abandonar os apegos que nos prendem ao superficial e ao efêmero.
Vivemos uma era onde a busca incessante pelo prazer imediato e a segurança material tomam o lugar do propósito profundo. Os bens terrenos, muitas vezes, nos afastam de nossa essência mais autêntica e nos mantêm prisioneiros das sombras da insatisfação. Jesus, ao nos desafiar a deixar tudo por Ele e pelo Evangelho, não fala de um abandono vazio, mas de uma escolha consciente de transcendência, onde a verdadeira riqueza não está no acúmulo, mas no alinhamento com o princípio eterno de justiça, amor e verdade.
No entanto, é necessário compreender que essa renúncia não é uma perda, mas uma abertura para a multiplicação da vida interior. Jesus promete, no versículo 30, que "não há quem tenha deixado tudo... que não receba cem vezes tanto". Isto nos mostra que ao rompermos com os apegos àquilo que é transitório, criamos espaço para a verdadeira abundância, aquela que vem da união com o transcendente, com a unidade de todas as coisas.
O que, então, significa seguir Jesus no mundo contemporâneo? Significa, em essência, resgatar a nossa liberdade. Liberdade de não nos vermos apenas como indivíduos isolados, mas como partes integradas de um todo maior, no qual cada ação nossa ressoa na eternidade. A verdadeira liberdade é a liberdade do espírito que escolhe viver em consonância com a verdade universal, aquela que ultrapassa as fronteiras do egoísmo e do isolamento.
A última frase do Evangelho, "muitos que são os primeiros serão últimos, e os últimos serão primeiros", revela a verdade fundamental de que a ordem do mundo material não é a medida da verdadeira grandeza. Aqueles que, no olhar humano, parecem ter menos, são, na verdade, os que possuem o maior tesouro: a capacidade de se abrir para o amor, para a justiça e para a verdade que transcende as limitações da vida terrena.
Neste mundo onde a luta pelo reconhecimento e pelo poder continua a dominar, somos chamados a refletir sobre o que realmente importa. A busca incessante por conquistas externas e pelo reconhecimento social muitas vezes nos desvia do caminho que nos conduz à verdadeira realização. O primeiro passo é um movimento interior, um retorno ao princípio de unidade que rege o cosmos e a humanidade.
Hoje, ao olharmos para o nosso tempo, percebemos que estamos em um momento de transição. Muitos estão buscando significado e propósito em um mundo que, por vezes, parece vazio. Mas é justamente neste vazio que Deus nos chama a reconhecer a sua presença, a transcender a fragilidade das coisas materiais e a nos alinharmos com o princípio de vida eterna que nos foi revelado em Cristo.
Que, ao seguirmos este caminho de verdade, possamos ser os últimos aos olhos do mundo, mas os primeiros aos olhos de Deus. Que possamos, ao deixar para trás tudo o que nos prende, encontrar a verdadeira liberdade e abundância que só Ele pode oferecer.
A Inversão Escatológica: O Último Será o Primeiro e o Primeiro Será o Último (Mc 10,31)
A frase dita por Jesus em Marcos 10,31 — "Porém, muitos que são os primeiros serão últimos, e os últimos serão primeiros." — apresenta uma inversão radical da ordem humana e manifesta uma chave fundamental da economia divina. Esse ensinamento não pode ser compreendido apenas como uma moralidade social ou uma simples advertência contra a arrogância dos poderosos, mas deve ser aprofundado à luz da teologia do Reino de Deus, da cristologia e da escatologia.
1. A Economia do Reino de Deus
Na ordem terrena, a hierarquia humana baseia-se frequentemente na posse de bens, poder e prestígio. Os "primeiros" são aqueles que, segundo os critérios mundanos, detêm influência, privilégios e controle. No entanto, Jesus revela que o Reino de Deus opera segundo uma lógica distinta, onde a verdadeira grandeza não está no domínio, mas no serviço, na humildade e no amor desinteressado.
O Reino não é uma simples inversão mecânica da sociedade terrena, mas uma transformação radical dos critérios que definem grandeza e valor. Aqueles que são "últimos" no mundo — os pobres, os pequenos, os que se doam sem reservas — são, na verdade, os mais próximos da plenitude do ser, pois sua dependência de Deus e sua entrega ao bem os tornam verdadeiramente livres.
2. A Cristologia da Humildade e da Kenosis
O próprio Cristo é a suprema manifestação dessa inversão. Como afirma São Paulo em Filipenses 2,6-8, Ele, sendo Deus, "aniquilou-se a si mesmo" (κένωσις, kenosis), assumindo a condição de servo e obedecendo até a morte. Jesus não apenas ensina essa inversão, mas a vive em sua própria existência. A cruz é a consumação dessa lógica divina: na humilhação extrema, encontra-se a máxima exaltação.
Esse princípio de rebaixamento voluntário para a exaltação final também se manifesta na estrutura do discipulado. O verdadeiro seguidor de Cristo não busca o primeiro lugar, mas aceita caminhar pelo caminho do serviço e da renúncia, confiando na promessa do Reino.
3. A Escatologia da Justiça Divina
A afirmação de Jesus tem, ainda, um profundo sentido escatológico. No juízo final, aqueles que aparentemente triunfaram na história podem descobrir-se destituídos da verdadeira herança, enquanto aqueles que foram rejeitados e humilhados serão acolhidos na plenitude divina.
Essa inversão é a revelação da justiça última de Deus, que não se baseia em aparências externas, mas na verdade do coração humano. Como Jesus ensina em Mateus 25,31-46, no julgamento final, os que serviram os pequeninos e necessitados serão recebidos no Reino, enquanto aqueles que viveram para si mesmos experimentarão a perda do verdadeiro bem.
4. A Liberdade e o Chamado à Conversão
Este ensinamento não significa que todo rico ou poderoso será condenado, nem que toda pessoa marginalizada será automaticamente exaltada. A inversão de valores do Reino não é um determinismo moral ou social, mas um convite à conversão. Aqueles que estão entre os "primeiros" no mundo são chamados a reconhecer a relatividade de suas conquistas e a se abrirem ao serviço, enquanto aqueles que são "últimos" podem encontrar, na entrega a Deus, a verdadeira grandeza.
A frase de Jesus, portanto, é um chamado à liberdade autêntica: liberdade da soberba e do apego ao transitório para aqueles que são "primeiros", e liberdade da desesperança para aqueles que são "últimos". No fim, a grandeza será medida não pelo que se possui, mas pelo que se ama e se entrega.
Conclusão
"Os primeiros serão últimos e os últimos serão primeiros" não é apenas uma advertência, mas uma revelação da estrutura profunda do Reino de Deus. A grandeza não se mede pelo poder humano, mas pela disposição de servir e amar. Jesus, como primeiro e último, como servo e Senhor, é o próprio modelo dessa inversão sagrada, e nos chama a segui-lo nesse caminho paradoxal que conduz à verdadeira vida.
EXPLICAÇÃO TEOLÓGICA
Leia também: LITURGIA DA PALAVRA
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