Liturgia Diária
11 – TERÇA-FEIRA
5ª SEMANA DO TEMPO COMUM
(verde – ofício do dia)
Vinde, adoremos e prostremo-nos por terra, e ajoelhemo-nos ante o Deus que nos criou! Porque ele é o nosso Deus, nosso Pastor (Sl 94,6s).
Com a potência originária de Sua Palavra, Deus plenifica a manifestação do Ser com multidões de essências viventes, refletindo múltiplas expressões da Vida. No ápice dessa irradiação, plasma o homem e a mulher, infundindo-lhes a participação na dinâmica divina do existir. Cristo revela a insuficiência das construções humanas quando estas se afastam da Verdade primordial, chamando as consciências a retornarem à Fonte. Elevemos nosso louvor Àquele que sustenta a ordem da Criação no mistério do Ser.
Evangelium secundum Marcum 7,1-13
1 Et conveniunt ad eum pharisæi et quidam de scribis, qui ab Jerosolymis venerant.
E reuniram-se junto a Ele os fariseus e alguns escribas que tinham vindo de Jerusalém.
2 Et cum vidissent quosdam ex discipulis ejus communibus manibus, id est non lotis, manducare panes, vituperaverunt.
E, vendo que alguns dos Seus discípulos comiam o pão com as mãos impuras, isto é, sem as terem lavado, censuraram-nos.
3 Pharisæi enim et omnes Judæi, nisi crebro lavent manus, non manducant, tenentes traditionem seniorum;
De fato, os fariseus e todos os judeus, se não lavarem frequentemente as mãos, não comem, guardando a tradição dos antigos;
4 et a foro nisi baptizentur, non comedunt; et alia multa sunt, quæ tradita sunt illis servanda, baptismata calicum, et urceorum, et æramentorum, et lectorum;
E, quando vêm da praça, se não se purificam, não comem; e há muitas outras observâncias que receberam e guardam, como a lavagem de copos, jarros, vasos de bronze e leitos.
5 Et interrogant eum pharisæi et scribæ: Quare discipuli tui non ambulant juxta traditionem seniorum, sed communibus manibus manducant panem?
Então, os fariseus e escribas Lhe perguntaram: Por que os Teus discípulos não seguem a tradição dos antigos, mas comem o pão com mãos impuras?
6 At ille respondens, dixit eis: Bene prophetavit Isaias de vobis hypocritis, sicut scriptum est: Populus hic labiis me honorat, cor autem eorum longe est a me;
Ele, porém, respondendo, disse-lhes: Bem profetizou Isaías a vosso respeito, hipócritas, como está escrito: Este povo honra-Me com os lábios, mas o seu coração está longe de Mim.
7 in vanum autem me colunt, docentes doctrinas et præcepta hominum.
Em vão Me adoram, ensinando doutrinas que são preceitos humanos.
8 Relinquentes enim mandatum Dei, tenetis traditionem hominum, baptismata urceorum, et calicum: et alia similia huic facitis multa.
Deixando o mandamento de Deus, aderistes à tradição dos homens, como a purificação de jarros e copos, e fazeis muitas outras coisas semelhantes.
9 Et dicebat illis: Bene irritum facitis præceptum Dei, ut traditionem vestram servetis.
E dizia-lhes: Invalidais bem o mandamento de Deus para guardardes a vossa tradição.
10 Moyses enim dixit: Honora patrem tuum et matrem tuam; et: Qui maledixerit patri, aut matri, morte moriatur.
Pois Moisés disse: Honra teu pai e tua mãe; e: Quem amaldiçoar pai ou mãe, seja punido com a morte.
11 Vos autem dicitis: Si dixerit homo patri, aut matri: Corban, quod est donum, quodcumque ex me tibi profuerit;
Mas vós dizeis: Se alguém disser ao seu pai ou à sua mãe: ‘Corban’, isto é, ‘Oferta ao Senhor’ aquilo que poderias receber de mim,
12 et ultra non dimittitis eum quidquam facere patri suo aut matri,
vós não permitis que ele faça mais nada por seu pai ou por sua mãe,
13 rescindentes verbum Dei per traditionem vestram, quam tradidistis: et similia hujusmodi multa facitis.
anulando a Palavra de Deus pela tradição que transmitistes. E fazeis muitas outras coisas semelhantes a estas.
Reflexão:
"Populus hic labiis me honorat, cor autem eorum longe est a me."
"Este povo honra-Me com os lábios, mas o seu coração está longe de Mim." (Mc 7:6)
Essa frase resume a crítica central de Jesus à hipocrisia religiosa, mostrando que a verdadeira fidelidade a Deus não se manifesta apenas em ritos exteriores, mas na autenticidade do coração e na adesão sincera à Sua vontade.
O impulso criador de Deus não se encerra em prescrições externas, mas na interiorização do Seu desígnio. A pureza não brota de ritos vazios, mas da adesão ao fluxo vivo do Espírito que tudo renova. A tradição, quando se desconecta da fonte divina, obscurece a ascensão da consciência e aprisiona a alma na ilusão do formalismo. Cristo chama o homem a superar as barreiras impostas pelo temor e pela rigidez, para que a verdade da Vida divina possa emergir. A obediência autêntica não está em normas inertes, mas na sintonia com a evolução do Ser em Deus. Toda realidade é dinamismo sagrado em direção ao cumprimento do Amor.
HOMILIA
Do Formalismo à Essência da Vida
Amados irmãos e irmãs, ao meditarmos sobre as palavras de Cristo no Evangelho de Marcos 7,1-13, somos confrontados com uma realidade sempre presente na história da humanidade: a tentação de substituir a essência pela forma, o espírito pelo rito, a verdade viva por tradições que, embora bem-intencionadas, podem sufocar o sopro divino que nos convida à transformação.
Os fariseus e escribas aproximam-se de Jesus, preocupados com a observância externa das purificações rituais, mas Ele os desafia com uma verdade cortante: “Este povo honra-Me com os lábios, mas o seu coração está longe de Mim” (Mc 7,6). Com essas palavras, o Senhor ilumina uma enfermidade que perpassa os séculos e chega até nossos dias: o risco de uma fé que se atém às aparências e esquece a substância, de um mundo que prioriza convenções e negligencia a verdade mais profunda do ser.
Se olharmos ao nosso redor, perceberemos que, em muitas esferas da vida, caímos no mesmo erro dos fariseus. Criamos sistemas, doutrinas, tradições e códigos que, ao invés de nos aproximarem do Mistério, muitas vezes nos distanciam d’Ele. A sociedade moderna, com seus avanços e desafios, exalta o progresso, mas por vezes esquece a fonte da vida; busca o aperfeiçoamento exterior, mas negligencia a transformação interior. Multiplicamos normas, estruturas e regras, mas o essencial continua sendo a abertura do coração ao fluxo criador da graça.
Cristo não despreza as tradições, mas ensina que elas devem ser meios para um encontro verdadeiro com Deus, não fins em si mesmas. A vida espiritual não se reduz a meros hábitos religiosos ou fórmulas repetidas, mas se manifesta na entrega total ao dinamismo divino que tudo renova. A purificação que Deus deseja não é apenas das mãos, mas do coração; não apenas dos gestos, mas das intenções; não apenas das práticas, mas da própria consciência.
Nos dias de hoje, quando as estruturas do mundo se agitam e muitas certezas se desmoronam, somos chamados a um retorno à autenticidade da fé, a uma busca que vá além do superficial, além do que é meramente visível e regulamentado. O Senhor convida cada um de nós a ser mais do que seguidores de ritos: Ele nos chama a sermos participantes vivos da obra divina, instrumentos da verdade e do amor que não se corrompem.
Que a nossa vida não seja um culto vazio, mas um caminho de integração com a vontade do Pai. Que nossas palavras sejam reflexo de um coração unido a Deus, e não apenas ecos de fórmulas repetidas. Que o nosso olhar seja voltado não apenas para o que é instituído pelo homem, mas para a verdade eterna que nos habita e nos transforma. Pois o Reino não se ergue sobre tradições mortas, mas sobre a fusão de nossa alma com a Vida que não tem fim.
EXPLICAÇÃO TEOLÓGICA
A Honra dos Lábios e a Distância do Coração: Uma Reflexão Teológica Profunda
A frase de Marcos 7:6 — “Este povo honra-Me com os lábios, mas o seu coração está longe de Mim” — remete diretamente a Isaías 29:13 e carrega uma crítica incisiva à hipocrisia religiosa. Cristo dirige essas palavras aos fariseus e escribas que, apesar de sua estrita observância das tradições exteriores, haviam se afastado da verdadeira essência da relação com Deus.
1. A Separação entre a Palavra e o Ser
A estrutura da frase revela uma oposição entre a exterioridade e a interioridade: há um louvor verbal (“honra-Me com os lábios”), mas ele não corresponde à disposição do ser mais profundo (“o seu coração está longe de Mim”). O que Cristo denuncia aqui não é apenas uma falha moral, mas uma corrupção ontológica do culto. O coração, na Sagrada Escritura, é o centro da vontade, do intelecto e da afetividade, ou seja, é o núcleo essencial do homem. Quando esse núcleo se distancia de Deus, toda prática religiosa torna-se vazia, um ritualismo sem vida.
2. A Religião Exterior sem Conversão Interior
A teologia da graça nos ensina que a verdadeira adoração não se limita à observância externa das normas, mas exige uma conversão do interior. O culto genuíno não é meramente a repetição de fórmulas sagradas, mas a entrega do ser à realidade divina. A crítica de Cristo à hipocrisia farisaica não se dirige ao cumprimento da Lei em si, mas ao modo como ela era praticada: sem a correspondência entre o rito e a verdade interior.
Quando o coração está distante, a religião torna-se uma máscara. Os lábios podem pronunciar louvores e recitar escrituras, mas se a vida interior não está ancorada na verdade e na caridade, essa devoção torna-se um ruído vazio diante de Deus. O próprio Cristo reforça essa ideia em Mateus 23:27, ao comparar os fariseus a sepulcros caiados: belos por fora, mas cheios de corrupção por dentro.
3. A Adoração em Espírito e Verdade
Se a crítica de Cristo expõe o problema, sua própria vida apresenta a solução: a adoração autêntica deve ser feita “em espírito e verdade” (Jo 4:23-24). O coração próximo de Deus não se mede pelo cumprimento mecânico de preceitos, mas pela profunda conformidade da alma com a vontade divina. Essa transformação só é possível pela ação da graça, que purifica o homem desde o seu interior, permitindo que seu louvor não seja apenas de lábios, mas uma expressão autêntica do amor a Deus.
Assim, esta passagem não condena o culto externo, mas exige que ele seja a expressão visível de um coração verdadeiramente unido a Deus. A santidade não consiste apenas em dizer as palavras certas, mas em permitir que a Verdade transforme o ser inteiro.
4. O Chamado à Integração do Ser na Verdade
O ensinamento de Cristo aponta para a necessidade de uma integração entre a fala e a essência, entre a prática e o coração. A honra dada a Deus não pode ser apenas um discurso, mas deve brotar de um coração que vive em conformidade com Ele.
Portanto, essa frase é um convite à autenticidade espiritual. Deus não se contenta com a aparência da piedade, mas deseja um coração que esteja verdadeiramente unido ao Seu. O verdadeiro culto é aquele em que os lábios falam da abundância do coração (cf. Lc 6:45), e não de um costume vazio.
Somente na plena união com Deus é possível que a honra dada a Ele seja verdadeira, pois será fruto de um coração que não está longe, mas habitado por Sua presença viva.
Leia também: LITURGIA DA PALAVRA
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