Liturgia Diária
20 – QUINTA-FEIRA
6ª SEMANA DO TEMPO COMUM
(verde – ofício do dia)
Sede para mim um Deus protetor e um lugar de refúgio, para me salvar. Porque sois minha força e meu refúgio e, por causa do vosso nome, me guiais e sustentais (Sl 30,3s).
Após a grande purificação das águas, o Eterno, que nunca apartou Sua essência da existência humana, manifesta novamente Sua aliança com Noé e sua linhagem, convocando-os a participar da ordenação sagrada da criação. O cosmos ressoa com a Vontade divina, e a consciência do ser é chamada a colaborar na edificação do real segundo o desígnio superior. Ao renovarmos, em nosso íntimo, nossa adesão ao Verbo encarnado, elevemos nosso ser à sintonia com a Mente divina, para que nossa vontade se conforme à Inteligência que tudo sustenta e direciona para a plenitude do Ser.
Evangelium secundum Marcum 8,27-33
27 Et egressus est Iesus et discipuli eius in castella Caesareae Philippi: et in via interrogabat discipulos suos, dicens eis: Quem me dicunt esse homines?
E Jesus saiu com seus discípulos para as aldeias de Cesareia de Filipe, e no caminho interrogava seus discípulos, dizendo-lhes: Quem dizem os homens que eu sou?
28 Qui responderunt illi, dicentes: Ioannem Baptistam, alii autem Eliam, alii vero quasi unum de prophetis.
E eles responderam: João Batista; outros, Elias; e outros, um dos profetas.
29 Tunc dicit illis: Vos vero quem me esse dicitis? Respondens Petrus ait ei: Tu es Christus.
Então lhes perguntou: E vós, quem dizeis que eu sou? Pedro, respondendo, disse-lhe: Tu és o Cristo.
30 Et comminatus est eis, ne cui dicerent de illo.
E ordenou-lhes severamente que a ninguém dissessem isso a respeito dele.
31 Et coepit docere illos, quoniam oportet Filium hominis pati multa, et reprobari a senioribus et a summis sacerdotibus et scribis, et occidi, et post tres dies resurgere.
E começou a ensiná-los que era necessário que o Filho do Homem sofresse muito, fosse rejeitado pelos anciãos, pelos príncipes dos sacerdotes e pelos escribas, fosse morto e, depois de três dias, ressuscitasse.
32 Et palam verbum loquebatur. Et apprehendens eum Petrus, coepit increpare eum.
E dizia-lhes isso abertamente. Então Pedro, tomando-o à parte, começou a repreendê-lo.
33 Qui conversus et videns discipulos suos, comminatus est Petro, dicens: Vade retro me, Satana, quoniam non sapis quae Dei sunt, sed quae sunt hominum.
Mas ele, voltando-se e olhando para seus discípulos, repreendeu Pedro, dizendo: Vai para trás de mim, Satanás, porque não compreendes as coisas de Deus, mas as dos homens.
Reflexão:
Tunc dicit illis: Vos vero quem me esse dicitis? Respondens Petrus ait ei: Tu es Christus.
Então lhes perguntou: E vós, quem dizeis que eu sou? Pedro, respondendo, disse-lhe: Tu és o Cristo. (Mc 8:29
Essa frase é central porque revela o reconhecimento de Pedro sobre a identidade de Jesus, marcando um momento decisivo na compreensão dos discípulos sobre sua missão.
O Cristo se revela como eixo da consciência que desperta para o sentido do real. No coração humano, há ecos da verdade que ainda não se completaram, por isso as respostas sobre Ele oscilam entre memórias do passado e lampejos do futuro. Pedro vê, mas não enxerga inteiramente; tenta proteger o Mestre, mas resiste ao caminho que leva à plenitude. A cruz não é apenas sofrimento, mas a travessia necessária para a expansão do ser. O que nos limita é a ilusão do imediato, o apego à superfície. Somente quando a mente se alinha ao desígnio supremo, transcendo o humano e acolhendo o divino, a realidade se ilumina na direção de sua consumação.
HOMILIA
Título: O Despertar para a Verdade Interior
Queridos irmãos e irmãs,
O Evangelho de hoje nos apresenta um momento crucial na caminhada dos discípulos de Jesus. Ele os questiona: “E vós, quem dizeis que eu sou?” (Marcos 8,29). Este momento não é apenas um ponto de reflexão para os discípulos de Jesus, mas é também um convite para todos nós, em nossos tempos, refletirmos sobre quem somos e qual é o nosso lugar no grande plano da criação.
Vivemos em um mundo fragmentado, onde as respostas rápidas e superficiais muitas vezes obscurecem as questões mais profundas. Em nossa busca incessante por respostas fáceis, nos esquecemos de nos perguntar sobre o que verdadeiramente nos define. A pergunta de Jesus a seus discípulos ressoa fortemente nos dias de hoje, quando as imagens que projetamos sobre nós mesmos ou sobre os outros, muitas vezes se afastam da verdade profunda. Jesus, em sua plenitude, não pode ser reduzido a um simples conceito. Ele é a Verdade que transcende os limites da compreensão humana imediata. Quando Pedro responde a Jesus, reconhecendo-o como o Cristo, ele aponta para algo além do conhecido e do visível. Ele aponta para o Cristo eterno, para aquele que é a fonte e o fim de toda a existência.
No mundo atual, onde as tensões políticas, sociais e econômicas se intensificam, muitas vezes somos levados a colocar nossa esperança em soluções temporais e divisivas. A política se torna um campo de disputas e de redução das pessoas a rótulos. A busca incessante por sucesso material e pelo poder nos faz esquecer o verdadeiro propósito do ser humano: a busca pela verdade, pela harmonia e pela colaboração no grande movimento da criação. O que nos é proposto por Jesus é uma visão ampla, onde não há lugar para divisões ou interesses egoístas. Ele nos chama a olhar além do imediato, a perceber que somos parte de algo maior, um movimento universal de amor e transformação.
A resposta de Jesus à tentativa de Pedro de proteger-lhe da cruz – “Vai para trás de mim, Satanás, porque não compreendes as coisas de Deus, mas as dos homens” (Marcos 8,33) – nos desafia a abandonar a visão limitada que muitas vezes temos da vida. A cruz não é um símbolo de derrota, mas de superação. O sofrimento que Jesus nos ensina a aceitar e a enfrentar não é um fim, mas um caminho. A nossa vida se desvela, muitas vezes, em momentos de dor e de perda, mas é nesse processo de transformação e de superação que encontramos o verdadeiro sentido da existência humana. Não podemos buscar evitar a cruz, mas, sim, entendê-la como a porta pela qual passamos para a verdade e para a realização de nosso destino mais profundo.
Nos tempos de hoje, a grande tentação é a de buscar soluções rápidas, eficazes, que nos afastam da verdade que está no coração de cada um de nós. Buscamos muitas vezes respostas fáceis, fórmulas que nos tragam alívio imediato, mas a verdadeira sabedoria, a verdadeira resposta, se encontra na capacidade de nos conectarmos com o propósito mais profundo de nossa existência. A verdade não é algo que se encontra em uma fórmula pronta, mas em uma busca constante, em uma transformação que passa pela aceitação da nossa humanidade e do nosso papel no grande projeto divino.
Portanto, ao refletirmos sobre a pergunta de Jesus, somos chamados a ir além das convenções e aparências, a perceber que somos convocados a participar de um movimento de transformação contínua. A nossa tarefa não é esperar passivamente que a verdade nos seja revelada de uma vez, mas nos envolver em um processo de crescimento que exige colaboração, reflexão e uma disposição para a mudança profunda. Somos chamados a ser co-criadores com Deus na edificação de um mundo mais justo, mais harmonioso e mais alinhado com o amor divino.
Que cada um de nós, ao contemplar a pergunta de Jesus – "Quem dizeis que Eu sou?" – possa, em resposta, perceber que somos chamados a reconhecer não apenas a nossa verdade, mas a verdade universal que nos conecta a todos. Que possamos ser testemunhas dessa verdade, transformando o mundo com nossas ações e atitudes, em harmonia com o grande desígnio divino. Que possamos, ao seguir Cristo, não apenas buscar o nosso próprio bem-estar, mas contribuir para a realização do bem comum, para a edificação de um futuro mais pleno e iluminado para todos.
Amém.
EXPLICAÇÃO TEOLÓGICA
A Restauração da Visão como Símbolo da Iluminação Espiritual
A frase “Depois, novamente lhe impôs as mãos sobre os olhos, e começou a ver, e foi restaurado, de modo que via claramente todas as coisas” (Mc 8,25) está inserida no episódio da cura do cego de Betsaida, um dos relatos mais ricos em simbolismo teológico no Evangelho segundo Marcos. Este versículo marca o ápice de um processo de restauração que não acontece de forma instantânea, mas em etapas, apontando para uma profunda realidade espiritual: a iluminação do ser humano não é um evento súbito, mas uma jornada progressiva em direção à verdade plena.
1. A Cura como Processo e a Pedagogia de Deus
Diferente de outras curas operadas por Jesus, em que a restauração é imediata, aqui a cura ocorre em dois momentos distintos. No primeiro toque, o homem passa da cegueira total para uma visão confusa (“Vejo os homens, mas parecem árvores andando”, Mc 8,24). Somente após um segundo toque suas faculdades visuais são completamente restauradas.
Teologicamente, essa progressão representa o itinerário espiritual da alma humana. A visão parcial simboliza aqueles que começam a perceber a verdade, mas ainda a compreendem de forma fragmentada. É um estágio inicial da fé, onde a realidade divina ainda é obscurecida por limitações humanas. Somente com uma nova intervenção da graça a alma alcança a verdadeira clareza, vendo “todas as coisas” com nitidez.
2. O Significado das Mãos de Jesus e a Ação da Graça
A imposição das mãos sobre os olhos remete ao contato direto entre o Verbo encarnado e a fragilidade humana. Jesus, como verdadeiro Deus e verdadeiro homem, é o mediador que transmite a luz divina ao intelecto e ao coração do homem. A cura progressiva reforça a ideia de que a graça atua no tempo, respeitando o desenvolvimento da alma e conduzindo-a, de forma pedagógica, à plenitude da visão espiritual.
3. A Visão Clara e o Conhecimento da Verdade
O texto enfatiza que, após o segundo toque, o homem “via claramente todas as coisas”. Essa clareza não se refere apenas ao sentido físico da visão, mas simboliza a percepção integral da realidade segundo a ótica divina. Na tradição teológica, a “visão clara” é frequentemente associada à sabedoria, que permite enxergar o mundo não mais segundo as aparências, mas segundo a verdade última de Deus.
Isso ecoa a transformação que ocorre na alma quando ela, purificada pela graça, é capaz de perceber o desígnio divino por trás da criação e da história. O homem restaurado é aquele que, tendo sido tocado pelo Cristo, agora vê o mundo não com olhos meramente humanos, mas com uma percepção iluminada pelo Espírito.
4. A Relação com o Contexto do Evangelho de Marcos
Essa cura precede imediatamente a confissão de Pedro (“Tu és o Cristo”, Mc 8,29) e a subsequente correção de Jesus quando Pedro tenta afastá-lo da cruz (“Não compreendes as coisas de Deus, mas as dos homens”, Mc 8,33). Isso sugere que a cura do cego de Betsaida não é apenas um milagre físico, mas uma metáfora para a jornada dos próprios discípulos: eles começam a reconhecer Jesus, mas sua visão ainda é limitada e turva. Apenas após a ressurreição compreenderão plenamente quem Ele é.
5. Implicações Teológicas e Espirituais
Essa passagem nos ensina que:
- A fé é um processo progressivo: ninguém nasce com a visão espiritual plenamente desenvolvida; é preciso ser constantemente tocado pela graça.
- Cristo é o agente da restauração: somente pela ação do Verbo encarnado podemos passar da cegueira espiritual para a contemplação da verdade.
- A clareza da visão é o destino final da alma: como o homem restaurado via “todas as coisas claramente”, também nós somos chamados a alcançar uma percepção plena do real, que será consumada na visão beatífica.
Assim, essa frase não apenas narra um milagre, mas revela uma verdade profunda sobre a jornada do homem rumo à luz divina. Ela nos lembra que, ainda que nossa visão seja imperfeita hoje, se permitirmos que Cristo continue a nos tocar, um dia veremos todas as coisas com absoluta clareza.
Leia também: LITURGIA DA PALAVRA
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