Liturgia Diária
7 – SEXTA-FEIRA
4ª SEMANA DO TEMPO COMUM
(verde – ofício do dia)
Salvai-nos, Senhor nosso Deus, e do meio das nações nos congregai, para ao vosso nome agradecer e para termos nossa glória em vos louvar! (Sl 105,47)
Insondáveis são os caminhos pelos quais a Bondade se manifesta na jornada de cada dia. O essencial não é apenas reconhecer tais vias, mas permanecer nelas com fidelidade, ainda que sombras se interponham. Pois o Bem não se mede pelo instante, mas pelo eterno que nele ressoa. A alma que se sustenta na Fonte inesgotável da Graça não se esgota nos desafios do tempo. Assim, na Sagrada Escritura ressoa o chamado que transcende o transitório: “Perseverai no amor fraterno” — e nesse amor, encontramos o eixo que alinha a existência ao desígnio divino.
Marcos 6:14-29 (Vulgata)
14 Et audivit rex Herodes (manifestum enim factum est nomen ejus), et dicebat : Quia Joannes Baptista resurrexit a mortuis, et propterea virtutes operantur in eo.
14 E o rei Herodes ouviu falar disso (pois o nome de Jesus se tornara conhecido) e dizia: João Batista ressuscitou dos mortos, e por isso operam nele esses poderes.
15 Alii autem dicebant : Quia Elias est. Alii vero dicebant : Quia propheta est, quasi unus ex prophetis.
15 Outros diziam: É Elias. E outros: É um profeta, como um dos antigos profetas.
16 Quo audito Herodes ait : Quem ego decollavi Joannem, hic a mortuis resurrexit.
16 Ouvindo isso, Herodes disse: João, a quem mandei decapitar, ressuscitou dos mortos.
17 Ipse enim Herodes misit, ac tenuit Joannem, et vinxit eum in carcere propter Herodiadem uxorem Philippi fratris sui, quia duxerat eam.
17 Pois o próprio Herodes havia mandado prender João e lançá-lo no cárcere por causa de Herodíades, mulher de seu irmão Filipe, a quem ele havia tomado por esposa.
18 Dicebat enim Joannes Herodi : Non licet tibi habere uxorem fratris tui.
18 Porque João dizia a Herodes: Não te é lícito ter a mulher de teu irmão.
19 Herodias autem insidiabatur illi : et volebat occidere eum, nec poterat.
19 E Herodíades o odiava e queria matá-lo, mas não podia.
20 Herodes enim metuebat Joannem, sciens eum virum justum et sanctum : et custodiebat eum, et audito eo multa faciebat, et libenter eum audiebat.
20 Pois Herodes temia João, sabendo que era homem justo e santo, e o protegia; e ao ouvi-lo, ficava perplexo, mas o escutava com prazer.
21 Et cum dies opportunus accidisset, Herodes natalis sui coenam fecit principibus, et tribunis, et primis Galilææ :
21 Mas chegou um dia oportuno, quando Herodes, no seu aniversário, ofereceu um banquete aos grandes da sua corte, aos tribunos e aos principais da Galileia.
22 cumque introisset filia ipsius Herodiadis, et saltasset, et placuisset Herodi simulque recumbentibus, rex ait puellæ : Pete a me quod vis, et dabo tibi.
22 E entrando a filha de Herodíades, dançou e agradou a Herodes e aos que estavam com ele à mesa. Então o rei disse à jovem: Pede-me o que quiseres, e eu te darei.
23 Et juravit illi : Quia quidquid petieris dabo tibi, licet dimidium regni mei.
23 E jurou-lhe: Tudo o que me pedires, eu te darei, ainda que seja metade do meu reino.
24 Quæ cum exisset, dixit matri suæ : Quid petam ? At illa dixit : Caput Joannis Baptistæ.
24 Ela saiu e perguntou à sua mãe: Que devo pedir? E sua mãe respondeu: A cabeça de João Batista.
25 Cumque introisset statim cum festinatione ad regem, petivit, dicens : Volo ut protinus des mihi in disco caput Joannis Baptistæ.
25 E voltando imediatamente ao rei, apressadamente pediu: Quero que me dês agora, num prato, a cabeça de João Batista.
26 Et contristatus est rex : propter jusjurandum, et propter simul discumbentes, noluit eam contristare.
26 O rei ficou muito triste, mas por causa do juramento e dos convidados, não quis recusar.
27 Sed misso spiculatore præcepit afferri caput ejus in disco. Et decollavit eum in carcere,
27 E enviando um carrasco, ordenou que trouxessem sua cabeça num prato. E João foi decapitado na prisão.
28 et attulit caput ejus in disco : et dedit illud puellæ, et puella dedit illud matri suæ.
28 E trouxe sua cabeça num prato, entregando-a à jovem, e esta a deu à sua mãe.
29 Quo audito, discipuli ejus venerunt, et tulerunt corpus ejus : et posuerunt illud in monumento.
29 Quando seus discípulos ouviram isso, vieram, tomaram o seu corpo e o colocaram num túmulo.
Reflexão:
"Sed misso spiculatore præcepit afferri caput ejus in disco."
"E enviando um carrasco, ordenou que trouxessem sua cabeça num prato." (Mc 6:27)
Essa frase representa o ponto culminante do martírio de João Batista, evidenciando a brutalidade do poder mundano diante da verdade profética. João não cedeu às pressões do mundo, e sua morte se tornou um testemunho eterno da fidelidade à missão divina.
A ascensão do justo, mesmo quando silenciado pelo poder, ecoa além das contingências do tempo. João Batista, precursor da Luz, não se perdeu na escuridão do cárcere, pois sua verdade resplandece no caminho dos que buscam o sentido último da existência. O mundo se agita diante da verdade, tentando aprisioná-la, mas a verdade não se detém. O sacrifício do profeta inscreve-se no horizonte da plenitude, onde cada queda é impulso para o devir. Assim, no mistério da história, a morte cede à Vida, e o martírio se transforma em semente de um Reino que não conhece ocaso.
HOMILIA
O Clamor dos Inocentes e o Silêncio dos Poderosos
Amados irmãos e irmãs, o Evangelho de hoje (Marcos 6,14-29) narra o martírio de João Batista, um profeta cuja voz foi silenciada pelo capricho de uma corte corrompida. João foi morto porque anunciou a verdade, porque não se curvou diante da imoralidade de Herodes e da perversidade de Herodíades. O rei, por vaidade e medo de perder prestígio diante de seus convidados, condenou um justo à morte. Essa passagem, tão antiga, ecoa de maneira assustadora em nosso tempo, quando a verdade continua sendo sufocada e os inocentes seguem sendo sacrificados no altar dos interesses humanos.
Hoje, o martírio não se dá apenas nas prisões ou pelo fio da espada, mas nas clínicas onde vidas indefesas são ceifadas antes mesmo de verem a luz do dia. O aborto, justificado por leis humanas e promovido como direito, não é senão a repetição do crime de Herodes. Se naquele tempo João Batista foi morto porque denunciava a corrupção do matrimônio, hoje os profetas que defendem a sacralidade da vida são perseguidos e silenciados. O clamor dos nascituros, que não podem falar, se assemelha ao grito de João, que não teve sua voz ouvida, mas cujo testemunho permanece.
Vivemos em uma sociedade onde o valor da vida é medido pelo desejo e pela conveniência, e onde os indefesos são descartados como se fossem um fardo. As leis humanas tentam substituir a ordem divina, declarando como lícito aquilo que, aos olhos de Deus, clama por justiça. Mas podemos nos calar diante disso? Como João, temos a coragem de proclamar a verdade? Ou nos deixamos levar pelo medo, pelo conforto e pela aceitação social?
O martírio de João Batista nos ensina que a verdade não depende da aceitação do mundo para ser verdade. Aquele que vive para Deus não teme os decretos dos homens. O tempo pode tentar sufocar a luz, mas a luz sempre encontra uma forma de brilhar. Assim também, a luta em defesa dos inocentes não é uma batalha perdida, mas uma resistência que prepara um novo amanhecer.
Que tenhamos a coragem de sermos voz para os que não têm voz. Que não nos deixemos seduzir pelas falsas promessas de um mundo que relativiza tudo em nome da liberdade. E que, se necessário for, saibamos perder tudo por fidelidade à Verdade, pois a vida não se encerra neste mundo, mas se cumpre na eternidade. Amém.
EXPLICAÇÃO TEOLÓGICA
A Decapitação de João Batista: O Conflito Entre a Verdade e o Poder Mundano
A frase “E enviando um carrasco, ordenou que trouxessem sua cabeça num prato.” (Mc 6,27) contém um simbolismo teológico profundo que transcende a brutalidade do fato histórico. O martírio de João Batista não é apenas um ato de injustiça, mas a manifestação de um conflito cósmico entre a Verdade e os poderes deste mundo. Analisemos seus principais aspectos à luz da teologia.
1. O Profeta como Voz da Verdade
João Batista foi o último dos profetas do Antigo Testamento e o precursor imediato de Cristo. Sua missão era preparar os caminhos do Senhor (Mc 1,3), chamando à conversão e denunciando o pecado, independentemente de quem o cometesse. Sua condenação revela a rejeição humana à Verdade divina: João não morre por conspirar contra Herodes, mas por proclamar a reta ordem moral instituída por Deus.
2. O Significado da Decapitação
A separação da cabeça do corpo simboliza, teologicamente, a tentativa do mundo de destruir a sabedoria divina. A cabeça é o centro da razão, da visão e da palavra – e João foi morto justamente por proclamar a verdade. Sua morte prefigura o que Jesus dirá aos discípulos: "Se me perseguiram a mim, também vos hão de perseguir" (Jo 15,20). A perseguição dos justos é um sinal da resistência humana à luz de Deus.
3. O Carrasco como Instrumento do Poder Corrupto
Herodes, ao enviar um carrasco para executar João, age não como um rei justo, mas como um governante fraco e escravizado por suas paixões. A presença do carrasco revela a impessoalidade do mal: o governante se esconde atrás de um executor, como Pilatos que mais tarde lavará as mãos diante da condenação de Cristo. O pecado busca sempre se ocultar atrás de estruturas que anestesiam a consciência.
4. O Prato como Sinal de Um Banquete Iníquo
O fato de a cabeça de João ser apresentada num prato carrega uma inversão profética: o banquete de Herodes, marcado pelo pecado e pela morte, antecipa um outro banquete, o da Última Ceia. No primeiro, um inocente é oferecido para satisfazer a vaidade de uma corte corrupta; no segundo, Cristo Se oferece para a redenção do mundo. O que Herodes faz por fraqueza, Cristo faz por amor.
5. João Batista como Prefiguração do Cristo Sofredor
A execução de João é um prelúdio da Paixão de Cristo. João é entregue por causa da verdade, assim como Jesus será entregue pelos chefes religiosos. Herodes teme a reação do povo, assim como Pilatos hesitará diante da multidão. A festa de Herodes, que culmina em morte, antecipa a festa pascal, que culmina na Ressurreição.
6. A Voz do Profeta Não Pode Ser Calada
A frase de Marcos 6,27 nos lembra que, embora o mundo tente silenciar a verdade, ela não pode ser destruída. A morte de João não foi o fim de sua missão; pelo contrário, seu testemunho continua ecoando na história. A Igreja, como Corpo de Cristo, assume essa missão profética, denunciando o pecado e anunciando a redenção, ainda que enfrente perseguições.
Assim, a decapitação de João Batista não é apenas um ato cruel da história, mas um sinal profundo do confronto eterno entre o Reino de Deus e o reino dos homens. E, como nos ensina Cristo, “o Reino dos Céus sofre violência, e os violentos o arrebatam” (Mt 11,12). O testemunho dos mártires, longe de ser apagado, torna-se a semente da fé que transforma o mundo.
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