Liturgia Diária
DIA 24 – QUINTA-FEIRA
OITAVA DA PÁSCOA
(branco, glória, seq. facultativa, pref. da Páscoa I [“neste dia”] – ofício próprio)
Celebraram, Senhor, teu santo nome, louvando em coro tua mão vitoriosa. Pois a Sabedoria abriu a boca dos mudos e tornou eloquentes as línguas das crianças, aleluia (Sb 10,20s).
A conversão é o despertar da consciência à presença do Eterno que caminha conosco. Não se trata de submissão, mas de abertura interior à Verdade que liberta. O Ressuscitado não impõe; Ele oferece paz — não como ausência de conflito, mas como plenitude da alma que reconhece sua origem transcendente. Sua presença sussurra liberdade no silêncio do ser, convidando-nos a testemunhar não doutrinas, mas a vida que se manifesta no amor e na escolha consciente. Ser sua testemunha é tornar-se expressão viva do mistério, onde cada gesto revela a dignidade da existência e a sacralidade da jornada interior.
Lectio sancti Evangelii secundum Lucam
Lucæ 24,35–48
35 Et ipsi narrabant quae gesta erant in via: et quomodo cognoverunt eum in fractione panis.
E eles contavam o que lhes acontecera no caminho, e como o tinham reconhecido ao partir o pão.
36 Dum autem haec loquuntur, stetit Jesus in medio eorum, et dicit eis: Pax vobis: ego sum, nolite timere.
Enquanto falavam dessas coisas, Jesus apresentou-se no meio deles e disse: A paz esteja convosco; sou eu, não tenhais medo.
37 Conturbati vero, et conterriti, existimabant se spiritum videre.
Mas eles, perturbados e cheios de medo, pensavam estar vendo um espírito.
38 Et dixit eis: Quid turbati estis, et cogitationes ascendunt in corda vestra?
E Ele lhes disse: Por que estais perturbados, e por que surgem essas dúvidas em vossos corações?
39 Videte manus meas, et pedes, quia ego ipse sum: palpate, et videte: quia spiritus carnem et ossa non habet, sicut me videtis habere.
Vede minhas mãos e meus pés: sou eu mesmo. Tocai-me e vede, pois um espírito não tem carne nem ossos, como vedes que eu tenho.
40 Et cum hoc dixisset, ostendit eis manus, et pedes.
E, dizendo isso, mostrou-lhes as mãos e os pés.
41 Adhuc autem illis non credentibus, et mirantibus prae gaudio, dixit: Habetis hic aliquid, quod manducetur?
Mas como ainda não acreditavam, de tanta alegria e espanto, perguntou-lhes: Tendes aqui algo para comer?
42 At illi obtulerunt ei partem piscis assi, et favum mellis.
Então lhe deram um pedaço de peixe assado e um favo de mel.
43 Et cum manducasset coram eis, sumens reliquias dedit eis.
E, tendo comido diante deles, deu-lhes o que restava.
44 Et dixit ad eos: Haec sunt verba, quae locutus sum ad vos, cum adhuc essem vobiscum: quoniam necesse est impleri omnia, quae scripta sunt in lege Moysi, et prophetis, et Psalmis de me.
E disse-lhes: São estas as palavras que vos falei quando ainda estava convosco: é necessário que se cumpram todas as coisas escritas a meu respeito na Lei de Moisés, nos Profetas e nos Salmos.
45 Tunc aperuit illis sensum, ut intelligerent Scripturas.
Então lhes abriu o entendimento para compreenderem as Escrituras.
46 Et dixit eis: Quoniam sic scriptum est, et sic oportebat Christum pati, et resurgere a mortuis die tertia:
E disse-lhes: Assim está escrito, e assim era necessário que o Cristo sofresse e ressuscitasse dos mortos ao terceiro dia;
47 Et praedicari in nomine ejus poenitentiam, et remissionem peccatorum in omnes gentes, incipientibus ab Jerusalem.
E que em seu nome fosse pregado o arrependimento e o perdão dos pecados a todas as nações, começando por Jerusalém.
48 Vos autem testes estis horum.
Vós sois testemunhas destas coisas.
Reflexão:
O Cristo ressuscitado surge não como um espectro, mas como presença viva, integral, que toca e se deixa tocar. Ele não rompe com a matéria, mas a eleva, tornando o corpo um sacramento do eterno. Sua aparição não impõe, convida. Revela-se no alimento, no gesto simples, na continuidade do amor. E ao abrir o entendimento dos discípulos, não os domina, mas os liberta: da dúvida, do medo, da ignorância. O verdadeiro testemunho nasce quando a liberdade interior se encontra com a verdade do espírito. Ser testemunha é escolher ver, compreender, e então, partilhar — não por dever, mas por consciência desperta.
Versículo mais importante:
O versículo mais importante de Lectio sancti Evangelii secundum Lucam – Lucæ 24,35–48, teologicamente e espiritualmente falando, é:
Tunc aperuit illis sensum, ut intelligerent Scripturas.
Então lhes abriu o entendimento para compreenderem as Escrituras. (Lucas 24:45)
Este versículo é central porque marca a transição entre o mistério escondido e a revelação plena. Aqui, Cristo não apenas se mostra presente, mas transforma o interior dos discípulos, abrindo sua consciência à realidade espiritual que sustenta todas as Escrituras. O entendimento que Ele concede não é meramente intelectual, mas uma iluminação do ser, um despertar da consciência para o sentido divino da história. Nesse gesto, Ele revela que a verdadeira fé não é crença cega, mas visão clara, livre, e profundamente enraizada no espírito da verdade.
HOMILIA
O Corpo da Luz e a Inteligência Desperta
Evangelho: Lucas 24,35–48
O Cristo surge no meio do círculo humano — não como um fantasma de memórias passadas, mas como presença viva, plena, vibrante de eternidade. Não é apenas reconhecido com os olhos, mas com o coração que arde e a consciência que se expande. Ele mostra as mãos e os pés não por necessidade de prova, mas para revelar que o eterno toca o temporal, e o invisível se faz visível na carne transfigurada.
Ele come. Ele fala. Ele caminha. Não paira acima da realidade: penetra-a. Com isso, indica que a matéria não é obstáculo, mas veículo. O mundo não é prisão, mas processo. O corpo, quando unido ao espírito, torna-se sacramento do infinito — expressão de uma liberdade que não se opõe à forma, mas a transforma por dentro.
Ao abrir a mente dos discípulos para compreenderem as Escrituras, Cristo não impõe uma verdade: ele revela a possibilidade do conhecimento iluminado. Desperta uma inteligência que é livre porque está enraizada na verdade do ser. Assim, o testemunho não nasce da obediência cega, mas da visão interior, do encontro entre a consciência e o real.
A missão que Ele confia é universal, mas não uniforme: é um chamado à expansão da luz em cada ser, à proclamação do perdão como força que liberta, à partilha do amor que não conhece fronteiras. E os que escutam esse chamado não se tornam repetidores de fórmulas, mas portadores da centelha — peregrinos do eterno em meio ao fluxo da história.
A paz que Ele oferece não é ausência de conflito, mas presença de sentido. É o repouso ativo de quem se sabe parte de um todo que se move em direção à plenitude. E reconhecer isso é deixar que o coração arda, o pão se parta, e os olhos finalmente se abram — para ver que Ele sempre esteve ali, no meio de nós.
EXPLICAÇÃO TEOLÓGICA
A frase "Então lhes abriu o entendimento para compreenderem as Escrituras" (Lucas 24:45) é um momento de transição crucial na narrativa evangélica e possui uma carga teológica profunda. Aqui, Cristo, após a sua ressurreição, realiza um gesto fundamental de revelação: Ele não apenas revela a si mesmo aos discípulos, mas também ilumina suas mentes e corações para que compreendam o significado profundo das Escrituras.
1. A Abertura do Entendimento:
O verbo "abrir" (em grego, "dianoigo") indica um processo de desobstrução, de abrir o caminho para a compreensão. O entendimento que é aberto não se refere a uma simples revelação de informações, mas a uma transformação do olhar interior. Os discípulos não estavam apenas diante de uma nova interpretação das Escrituras; estavam sendo imersos em uma nova forma de ver, de entender e de viver a verdade. Esse "abrir" é uma ação divina que leva o ser humano a um novo grau de percepção, permitindo que ele veja o Cristo não mais como um homem histórico, mas como o Messias pleno, o cumprimento das promessas divinas.
2. A Compreensão das Escrituras:
Cristo não simplesmente confirma o que estava nas Escrituras, mas mostra aos discípulos como todas as passagens, todas as palavras e eventos do Antigo Testamento se cumpriram Nele, de maneira plena e definitiva. A "compreensão das Escrituras" não é uma simples interpretação textual, mas uma revelação do seu significado profundo e eterno. As Escrituras, antes compreendidas de forma fragmentada e, muitas vezes, literal, agora são vistas à luz da ressurreição. O que antes era uma expectativa vaga, se torna uma compreensão clara e transformadora, onde cada palavra, cada profecia, aponta para o Cristo ressurreto como o centro e a consumação de toda a história divina.
3. O Espírito e o Entendimento:
Esse momento de iluminação não ocorre por um esforço humano, mas pela ação do próprio Cristo, que age como aquele que revela o Pai. Isso aponta para uma dinâmica de graça: o entendimento é dado, não conquistado. Como o próprio Cristo mais tarde prometeu ao Espírito Santo, Ele enviaria o Consolador para recordar aos discípulos tudo o que Ele lhes ensinou e para guiá-los na verdade. O entendimento dado por Cristo é, portanto, uma experiência mística e transcendente, mediada pela ação do Espírito Santo.
4. O Cristo como Chave Hermenêutica:
Cristo se torna a chave para a interpretação das Escrituras. Antes da ressurreição, os discípulos olhavam para as Escrituras com olhos limitados, não compreendendo que o cumprimento das promessas divinas não se daria através de um reinado terreno, mas por meio do sofrimento, da morte e da ressurreição. O Cristo ressurreto, ao abrir o entendimento dos discípulos, torna-se a chave hermenêutica que ilumina toda a Escritura. Ele é o Logos que dá sentido e unidade à Palavra escrita.
5. A Teologia da Revelação:
Essa abertura do entendimento é uma manifestação da teologia da revelação. Deus não se revela de forma abstrata ou distante, mas entra na história e revela a Si mesmo de forma concreta, pessoal e acessível. Cristo, sendo a Palavra viva, não apenas transmite conhecimento, mas oferece uma experiência transformadora que leva os discípulos à verdadeira compreensão. A revelação, portanto, não é algo que se limita a uma série de conceitos ou ideias, mas é uma experiência vital, existencial, que envolve todo o ser humano — sua mente, seu coração, sua vontade.
Em resumo, Lucas 24:45 revela o momento em que a verdadeira luz da compreensão espiritual se acende nos discípulos. Eles passam a perceber que todas as Escrituras apontam para o Cristo, e somente através d'Ele podem compreender o pleno significado da mensagem divina. Este ato de abrir o entendimento é uma graça divina que leva os discípulos da ignorância para o conhecimento verdadeiro, da escuridão para a luz, e da morte para a vida eterna.
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