Liturgia Diária
1 – TERÇA-FEIRA
13ª SEMANA DO TEMPO COMUM
(verde – ofício do dia da 1ª semana do saltério)
Povos todos do universo, batei palmas, gritai a Deus aclamações de alegria (Sl 46,2).
A obediência ao Princípio Supremo da Vida não é servidão, mas libertação profunda. Ao alinhar-se à Ordem invisível que sustenta o cosmos, a alma transcende os emaranhados do acaso e se eleva além dos contratempos que a oprimem. Nesse pacto silencioso com a Consciência que rege todas as coisas, renova-se a confiança no fluxo providente da existência. A verdadeira liberdade não nasce da ruptura com o Alto, mas da harmonia com Ele. Celebremos, pois, a fidelidade interior como ato de consciência desperta, e com alegria caminhemos na luz daquele que, sendo Fonte, conduz sem impor e governa sem dominar.
Evangelium secundum Matthaeum 8,23-27
Dominus increpat ventos et mare
23. Et ascendente eo in naviculam, secuti sunt eum discipuli eius.
E, entrando ele na barca, seus discípulos o seguiram.
24. Et ecce motus magnus factus est in mari, ita ut navicula operiretur fluctibus: ipse vero dormiebat.
E eis que houve uma grande tempestade no mar, de modo que a barca era coberta pelas ondas; mas ele dormia.
25. Et accesserunt ad eum discipuli eius, et suscitaverunt eum, dicentes: Domine, salva nos, perimus.
E os seus discípulos se aproximaram dele, e o despertaram, dizendo: Senhor, salva-nos, estamos perecendo.
26. Et dicit eis Jesus: Quid timidi estis, modicæ fidei? Tunc surgens imperavit ventis et mari, et facta est tranquillitas magna.
E Jesus lhes disse: Por que sois medrosos, homens de pouca fé? Então, levantando-se, repreendeu os ventos e o mar, e fez-se grande calmaria.
27. Porro homines mirati sunt, dicentes: Qualis est hic, quia venti et mare obediunt ei?
E os homens maravilharam-se, dizendo: Que homem é este, que até os ventos e o mar lhe obedecem?
Reflexão:
Neste encontro entre o medo humano e a serenidade do Verbo, revela-se um princípio de ordem que transcende o instinto de autopreservação. O Cristo dorme — não por ausência, mas por perfeita confiança na estrutura última da realidade. O caos das águas é símbolo das forças que ameaçam a autonomia interior, mas que se submetem quando o centro desperto da consciência se ergue em autoridade. A liberdade autêntica brota do reconhecimento dessa Presença interior, que ao ser ativada, acalma o mundo ao redor. A verdadeira soberania não é domínio exterior, mas sintonia com a harmonia que sustenta o real em sua totalidade.
Versículo mais importante:
O versículo mais importante de Evangelium secundum Matthaeum 8,23-27 é o versículo 26, pois nele se revela o poder de Cristo sobre a criação e a exigência da fé diante do medo.
26. Et dicit eis Jesus: Quid timidi estis, modicæ fidei? Tunc surgens imperavit ventis et mari, et facta est tranquillitas magna.
E Jesus lhes disse: Por que sois medrosos, homens de pouca fé? Então, levantando-se, repreendeu os ventos e o mar, e fez-se grande calmaria. (Mt 8:26)
HOMILIA
A Calma no Centro do Ser
No silêncio adormecido de Cristo, enquanto as águas se levantam e os ventos rugem, habita o mistério profundo da confiança que supera o instinto. O Evangelho de Mateus 8,23-27 nos convida a entrar na barca da existência, onde inevitavelmente as tempestades se apresentam — externas ou internas, visíveis ou invisíveis. Mas esta barca não é apenas metáfora de um percurso: é o lugar onde o eu é confrontado com os limites de sua própria fé.
No momento em que os discípulos clamam, revela-se não apenas o medo natural da morte, mas a ausência de uma interioridade amadurecida. O Cristo, ao repreender os ventos e o mar, não atua apenas sobre o mundo físico, mas desperta nos que o seguem a possibilidade de uma nova forma de ser: aquela em que a alma, centrada no eterno, encontra sua verdadeira liberdade não na ausência de desafios, mas na confiança que transforma o caos em harmonia.
A dignidade da pessoa está em reconhecer que há em si um núcleo — um ponto de quietude e presença — onde as ondas do mundo não alcançam. Esse ponto é Cristo adormecido, não por negligência, mas por estar em perfeita consonância com a Ordem do Todo. Despertá-lo em nós é despertar a autoridade da consciência unificada com o Espírito. Não se trata de domínio pela força, mas de uma ascendência que brota da integração com a Fonte da Vida.
Assim, o milagre não está apenas na calmaria do mar, mas na possibilidade de cada ser humano, em seu processo de evolução interior, encontrar esse centro inviolável e, a partir dele, irradiar paz ao mundo. Pois a liberdade verdadeira é confiar enquanto as ondas se agitam, sabendo que, mesmo dormindo, o Cristo em nós jamais abandona a barca. E a maturidade espiritual se revela quando não clamamos por socorro por desespero, mas despertamos a presença divina para que, com ela, caminhemos em direção ao que ainda não compreendemos, mas já começamos a confiar.
EXPLICAÇÃO TEOLÓGICA
O versículo retrata o Cristo como Senhor da criação e chama a atenção para a raiz do medo humano: a fé ainda débil. Ao perguntar “Por que sois medrosos, homens de pouca fé?”, Jesus não apenas censura a falta de confiança, mas expõe a dinâmica íntima entre a crença no Deus que sustém tudo e a paz que nasce dessa certeza.
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Cristologia e Soberania
Jesus levanta-se para repreender os ventos e o mar, mostrando-se não como simples profeta, mas como Aquele em cujo poder as forças primordiais do universo devem obedecer. Essa autoridade remete ao Logos criador (cf. Jo 1,3), capaz de impor ordem sobre o caos. -
Fé como ato livre
A fé aqui não é adesão passiva a um conjunto de ideias, mas uma decisão livre de confiar no Amor que sustém a existência. A pouca fé se traduz no descompasso entre o desejo interior de segurança e a disposição de entregar-se ao cuidado divino, que nos conduz sem nos aprisionar. -
Medo e fragmentação da alma
O medo, teologicamente, revela a alma ainda dividida: ela teme ser engolida pelas circunstâncias e, assim, revela um eu que busca autonomia fora da comunhão com o Criador. A calma que se segue demonstra que a verdadeira liberdade brota quando o ser humano reconhece sua dependência filial e reencontra sua integridade. -
Milagre como pedagogia divina
A “grande calmaria” não é apenas demonstração de poder, mas lição para os discípulos: o milagre oferece a experiência imediata da presença restauradora de Deus. Ele devolve ao coração humano o senso de dignidade, pois confirma que somos guardados e valorizados pela ordem eterna. -
Chamado à maturidade espiritual
Ao despertar o Senhor adormecido na barca, somos convidados a despertar, em nosso íntimo, a consciência dessa presença adormecida em nossa vida. A fé amadurece quando deixamos de clamar apenas pelo socorro e começamos a invocar a força que nos habita. -
Impulso para a liberdade autêntica
A narrativa não pretende eliminar toda tempestade — mas nos ensina a habitar o tumulto sem perder o centro. A verdadeira liberdade não consiste em evitar problemas, mas em permanecer serenos na certeza de que o Deus que nos sustenta jamais nos abandona.
Em suma, Mateus 8,26 nos convida a reconhecer a filiação divina que nos dá autoridade sobre nossos medos, a acolher a calmaria como fruto de uma fé operacional e a assumir a própria dignidade, sabendo que a criação inteira se curva àquele que dá sentido e abrigo ao nosso existir.
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