Liturgia Diária
4 – TERÇA-FEIRA
SÃO CARLOS BORROMEU, BISPO
(branco, pref. comum, ou dos pastores – ofício da memória)
Visitarei minhas ovelhas, diz o Senhor, e suscitarei um pastor que as apascentará; eu, o Senhor, serei o seu Deus (Ez 34,11.23s).
Carlos, nascido entre os montes da Itália, fez de sua vida um altar de serviço e disciplina interior. No silêncio da consciência, compreendeu que o verdadeiro poder não reside na imposição, mas na coerência entre o que se crê e o que se vive. Entre pestes e sofrimentos, manteve a serenidade do espírito que serve sem esperar retorno. Sua missão não foi apenas reformar estruturas, mas despertar a ordem invisível que sustenta toda virtude. Assim, o pão partilhado na mesa divina tornou-se símbolo da alma que, iluminada pela razão e pela fé, entrega-se inteiramente ao bem comum.
Dominica XXVIII per Annum — Evangelium secundum Lucam 14,15-24
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Audiens autem quidam de simul discumbentibus hæc dixit illi: Beatus qui manducabit panem in regno Dei.
Ao ouvir isso, um dos que estavam à mesa disse-lhe: Feliz aquele que comer o pão no Reino de Deus. -
At ipse dixit ei: Homo quidam fecit coenam magnam et vocavit multos.
Ele, porém, respondeu: Um homem deu um grande banquete e convidou muitos. -
Et misit servum suum hora coenae dicere invitatis ut venirent, quia jam parata sunt omnia.
E enviou seu servo, à hora do banquete, para dizer aos convidados que viessem, pois tudo já estava preparado. -
Et coeperunt simul omnes excusare. Primus dixit ei: Villam emi, et necesse habeo exire et videre illam; rogo te, habe me excusatum.
Mas todos, a uma só voz, começaram a escusar-se. O primeiro disse: Comprei um campo e preciso ir vê-lo; peço-te que me dispenses. -
Et alter dixit: Juga boum emi quinque, et eo probare illa; rogo te, habe me excusatum.
Outro disse: Comprei cinco juntas de bois e vou experimentá-los; peço-te que me dispenses. -
Et alius dixit: Uxorem duxi, et ideo non possum venire.
E outro disse: Casei-me e por isso não posso ir. -
Et reversus servus nuntiavit haec domino suo. Tunc iratus paterfamilias dixit servo suo: Exi cito in plateas et vicos civitatis, et pauperes ac debiles, et caecos et claudos introduc huc.
O servo voltou e contou isso ao seu senhor. Então o dono da casa, irado, disse: Sai depressa pelas praças e ruas da cidade e traz aqui os pobres, os aleijados, os cegos e os coxos. -
Et ait servus: Domine, factum est ut imperasti, et adhuc locus est.
O servo disse: Senhor, foi feito como ordenaste, e ainda há lugar. -
Et ait dominus servo: Exi in vias et sepes, et compelle intrare, ut impleatur domus mea.
O senhor disse: Sai pelos caminhos e cercas, e obriga-os a entrar, para que minha casa se encha. -
Dico autem vobis quod nemo virorum illorum qui vocati sunt gustabit coenam meam.
Pois eu vos digo: nenhum daqueles que foram convidados provará do meu banquete.
Verbum Domini
Reflexão:
O convite do banquete é a voz da ordem interior que chama à presença. Muitos a ignoram, presos às posses e aos afetos que os definem, e perdem o instante em que o espírito se revela. A mesa é o símbolo da comunhão com o que é verdadeiro, e o pão, a partilha da consciência desperta. O servo que busca os pobres e cegos é o impulso que conduz o ser à humildade. Aquele que aceita o chamado abandona as justificativas e encontra o silêncio fértil onde o dever e a liberdade se tornam uma só luz.
Versículo mais importante:
Evangelium secundum Lucam 14,23
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Et ait dominus servo: Exi in vias et sepes, et compelle intrare, ut impleatur domus mea.
E o senhor disse ao servo: Sai pelos caminhos e cercas, e obriga-os a entrar, para que minha casa se encha.(Lc 14:23)
Este versículo é o coração da parábola, pois revela a amplitude do convite divino: ninguém é excluído do banquete da verdade. O chamado ultrapassa fronteiras, alcança os esquecidos e os dispersos, convidando cada alma a participar da plenitude que não pertence aos privilégios do mundo, mas à disposição interior de quem se abre ao amor que tudo inclui e transforma.
HOMILIA
O Banquete da Consciência Desperta
No silêncio interior em que o espírito busca compreender a própria origem, o Evangelho do grande banquete revela-se como um espelho da jornada da alma. O convite feito pelo Senhor não é apenas um chamado religioso, mas a voz da própria Verdade que habita em tudo o que existe. A mesa do Reino não é lugar físico, mas estado de consciência — uma dimensão em que o ser se harmoniza com a ordem divina e reconhece que nada lhe pertence, exceto o dom de responder livremente ao chamado da Vida.
Os convidados que se desculpam representam as múltiplas distrações que o mundo oferece: o apego às posses, aos compromissos e às afeições que, embora legítimos, tornam-se prisões quando afastam o ser do essencial. O homem, em sua ânsia de domínio, esquece que o verdadeiro bem não se acumula, mas se compartilha; e que a plenitude não é conquista, mas comunhão. Aquele que se ausenta do banquete espiritual não o faz por castigo, mas por cegueira interior: ainda não reconhece que o alimento divino já lhe está servido.
O servo que sai às ruas e campos é o impulso do espírito que busca no mais simples o espaço fértil para a revelação. Ele representa o movimento da graça que desce ao nível da carência e da humildade, para erguer o que ainda dorme na ignorância. No coração dos pobres e esquecidos habita a abertura que os sábios, muitas vezes, perderam. Assim, a casa que se enche é o universo interior que se amplia quando o ser aceita ser morada do Eterno.
A liberdade que o Evangelho anuncia é a de quem reconhece o limite das próprias vontades e aprende a ordenar-se pela razão luminosa do Amor. Responder ao convite é ato de dignidade, pois implica escolher o que é superior, mesmo quando o inferior clama com mais força. O banquete é a celebração da consciência desperta, que se nutre da presença divina e compreende que servir é a forma mais alta de existir.
Na mesa do Reino, não há exclusões nem hierarquias: há apenas a comunhão daqueles que ouviram o chamado e se dispuseram a participar do festim da Eternidade — onde o pão é a verdade, o vinho é a sabedoria, e o silêncio é o altar do espírito reconciliado com o Todo.
EXPLICAÇÃO TEOLÓGICA
“Sai pelos caminhos e cercas, e obriga-os a entrar, para que minha casa se encha.” (Lc 14,23)
1. O Chamado que se Expande Além das Fronteiras
O versículo exprime o movimento da graça que não conhece barreiras. O “sair pelos caminhos e cercas” não é apenas um deslocar-se no espaço, mas um transpor das fronteiras interiores que limitam o homem em sua própria compreensão. O Senhor envia o servo como expressão da ação divina no mundo — o impulso invisível que convida todas as almas à comunhão com o princípio de unidade. A casa que se deve encher é a própria Criação, chamada a tornar-se templo vivo da Presença.
2. O Servo e a Obediência Consciente
O servo representa o ser que, tendo compreendido a voz do seu Senhor, age com desprendimento e firmeza. Sua missão não é convencer por força, mas despertar o que dorme, compelir pela luz, mover pela verdade. O verbo “obrigar” não indica violência, mas a urgência da vocação espiritual, que toca a alma com a autoridade daquilo que é eterno. A obediência que o servo manifesta é a síntese entre liberdade e dever, pois quem serve ao Absoluto age em conformidade com a razão universal que sustenta o cosmos.
3. A Casa que se Enche: Símbolo da Integração
A casa do Senhor é o símbolo da totalidade. Cada ser humano, ao aceitar o convite, ocupa o espaço que lhe é destinado no plano divino. Encher a casa é restaurar a harmonia rompida pela dispersão, reunindo o múltiplo em torno do Um. Aquele que entra não apenas encontra abrigo, mas participa da plenitude que dá sentido à existência. Quando todos os lugares forem ocupados, a Criação refletirá a ordem de onde veio: o banquete será o retorno do universo ao seio do seu princípio.
4. O Caminho Interior e a Superação das Cercas
As cercas e os caminhos indicam as resistências internas, as limitações da alma que ainda teme a luz. Caminhar por esses espaços é realizar a travessia do humano ao divino, deixando para trás a ignorância, o medo e o apego. Aquele que aceita o chamado atravessa suas próprias fronteiras, reconhecendo que a liberdade não é fuga, mas entrega consciente à vontade que o gerou. Cada passo é um ato de lucidez, cada avanço uma purificação do olhar.
5. A Urgência do Chamado Divino
“Compelle intrare” — “obriga-os a entrar” — revela a urgência com que o Senhor deseja a realização do seu desígnio. Essa urgência não nasce da impaciência, mas do amor que não suporta o vazio. O banquete está pronto, e a eternidade aguarda a presença de todos os convidados. A recusa humana é a recusa da própria felicidade; a aceitação é o reconhecimento de que a vida só encontra repouso quando retorna à Fonte.
6. A Liberdade como Plenitude do Dever
Responder ao chamado é o ato mais livre que o ser pode realizar. A liberdade verdadeira não consiste em escolher ao acaso, mas em alinhar-se com o que é justo, ordenado e verdadeiro. A alma que entra na casa divina não perde a si mesma, mas encontra-se em sua vocação mais alta. A plenitude não é fruto de conquista, mas de consentimento: o “sim” ao convite é o instante em que o finito se deixa preencher pelo infinito.
Síntese Final
O versículo revela o drama e a beleza da existência: um convite constante a sair de si e participar do banquete eterno. Caminhar pelos caminhos e cercas é atravessar o mundo interior, derrubar os muros da indiferença e abrir-se à comunhão com o Todo. A casa que se enche é o reflexo da alma que desperta, que, unida à Vontade superior, se torna espelho da ordem divina. Nesse movimento, a humanidade reencontra sua dignidade essencial — ser morada viva de Deus e expressão da razão que sustenta o universo.
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